Se em 2020 fomos surpreendidos por uma pandemia de impacto global, que gerou incertezas para países em todos os continentes, em 2021 colhemos suas consequências econômicas. Os alertas foram feitos já no início da pandemia, de que os lockdowns estabelecidos pelos governos poderiam trazer impacto na produção, preços e até mesmo no emprego.
A incerteza tomou conta dos agentes econômicos em 2020, pois não havia previsibilidade da extensão que a pandemia poderia atingir, quanto tempo iria durar e se alguma vacina ou cura seria alcançada no curto prazo. A primeira reação dos mercados à incerteza é a venda de ativos e o retorno à liquidez (ou à ativos menos arriscados). Esse movimento chegou a trazer o Índice Bovespa 48% abaixo do seu topo, já em janeiro.
Da mesma forma, à medida que novas certezas passaram a surgir, com os primeiros sinais promissores das vacinas em desenvolvimento, as projeções de recuperação da atividade passaram a melhorar significativamente e antes mesmo do final de 2020, já com os primeiros vacinados ao redor do mundo, a Bolsa brasileira já havia voltado aos patamares pré-Covid19. O que era um ano de incertezas, passou a ser um ano de esperança e estabilidade nos resultados dos investimentos.
Já o ano de 2021 começou com poucas novidades, com a vacinação pelo mundo acelerando, mas não no Brasil. O que seria um ano de recuperação e alívio nos riscos, passou a ser um ano bastante turbulento e cheio de eventos externos que bombardearam a confiança dos agentes.
O ano 2021 iniciou com inflação crescente, além das expectativas dos mercados. Parte pela pressão de preços de commodities, parte pela retomada do consumo no mundo em função da reabertura das economias (antes mesmo da retomada efetiva da produção) e parte pela drástica desvalorização do Real frente ao Dólar, causada majoritariamente pelo conflito institucional entre Legislativo, Executivo e Judiciário. Esse conflito, em especial na tratativa da pandemia, teve efeito direto nos preços de Atacado de produtos importados e aumentaram os custos de produção de diversos itens da cesta de consumo brasileira. Esses efeitos perduraram ao longo deste ano e devem ter alguma continuidade para o ano de 2022.
Somado a isso, alguns choques tornaram tudo ainda mais nebuloso. A crise hídrica que atingiu o país encareceu o custo da energia elétrica e da produção em geral. O preço esticado do petróleo, somado ao câmbio mais caro e eventos como do navio cargueiro Ever Given, preso no Canal de Suez, contribuíram para reduzir estoques do petróleo no mundo e encarecer o custo do combustível e do transporte terrestre. A crise hídrica também afetou a produção de vários alimentos, causando redução na oferta e encarecendo o preço ao consumidor final. Por fim, as dificuldades financeiras da gigante construtora chinesa Evergrande escancararam uma percepção dos mercados de que o motor de consumo no mundo, a China, está esfriando e que isso pode ser mais intenso do que o esperado.
A intensificação do conflito entre os poderes contribuiu para inflamar a animosidade e a incerteza dos agentes, em especial estrangeiros, que rapidamente começaram a retirar seus recursos investidos aqui. Se apenas isso não fosse suficiente, o alerta vermelho do risco fiscal voltou aos radares. Com o aumento significativo nos gastos em função da pandemia, a dívida do governo em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) voltou a crescer. Executivo e Legislativo encontraram nos programas sociais uma forma de recuperar algum capital político e a pressão por aumento de gastos nestes programas ganharam força, mas ainda sem uma origem dos recursos para o orçamento. O parcelamento dos precatórios indicou que o governo já não tinha espaço para novos gastos e optou por rolar os que já possuía.
Tudo isso culminou na revisão da metodologia de cálculo do teto de gastos, dando maior flexibilidade ao orçamento. Com aval do Congresso e do Judiciário no parcelamento dos precatórios, o mercado enxergou o que era mais claro: o Governo terá condições de elevar suas despesas ao aumentar o risco fiscal e, por consequência, passou a exigir prêmios e juros maiores para adquirir os títulos emitidos pelo Estado, ocasionando a derrubada dos preços desses títulos no mercado, que se comportam inversamente proporcionais às suas taxas.
Ao Banco Central restou um cenário, com baixo crescimento econômico e inflação acima das metas projetadas. Uma faca de dois gumes: ao aumentar os juros, prejudicaria ainda mais o crescimento já esfriado pelo desemprego e pela pandemia; ao manter os juros em níveis historicamente baixos, daria incentivos de crédito e geraria aumento do consumo, jogando ainda mais lenha na fogueira da inflação. No primeiro sinal de que a economia poderia aquecer acima do esperado, com o resultado do PIB do primeiro trimestre, o Banco Central abraçou a primeira opção com dedicação.
A imprevisibilidade destes eventos acumulados tornou qualquer projeção para 2021 irreais e pegou a estratégia da maioria dos gestores do mercado na contramão. Se fechamos 2020 com a crença de que a economia teria algum crescimento pós-pandemia, aquecidas pelos juros mais baixos da história, ainda com alguma inflação e que seria facilmente contida pelo Banco Central em algum momento, chegamos ao final do ano com um crescimento bastante pífio. O desemprego ainda extremamente elevado, índices de inflação novamente passando dos dois dígitos e a taxa de juros acelerando verticalmente, ainda sem qualquer sinal de sensibilidade nos preços.
Os mercados esperavam, ao final de 2020, a taxa Selic abaixo dos 4%, inflação na casa de 3% e juros reais de 1% para 2021. Chegamos neste mês de outubro com a Selic a 7,25%, inflação acumulada acima de 9% e juros reais de -1,75%. O reflexo disso veio nos resultados dos investimentos: não há títulos nas carteiras que remunerem a inflação e gerem ganho real, sem gerar uma boa parcela de volatilidade. As taxas de juros mais altas e as incertezas sobre o crescimento no Brasil e no mundo tornam os investimentos de maior risco menos interessantes, em especial aqueles em países emergentes. O reflexo disso foi a queda do Índice Bovespa, de junho a outubro, de aproximadamente 20%.
No início de 2021, os gestores do segmento de renda fixa haviam se estruturado para obter retornos com o fechamento das curvas de juros, já que a inflação estava contida e não havia indícios de elevação dos juros por parte do Banco Central. Este cenário se inverteu rapidamente a partir do fim do primeiro trimestre. A recuperação indicada na parcial do PIB abriu espaço para o movimento rápido do Banco Central subir os juros e conter a inflação, pegando os gestores de surpresa. Ainda que este movimento tenha sido pontual, os gestores continuaram a confiar no resultado da política monetária em segurar a inflação e alguns optaram por manter a posição, esperando o efeito de redução nos preços.
Novamente, os choques nos preços e a inflação internacional continuaram a empurrar a inflação para o alto. Novos movimentos de elevação de juros vieram na sequência, invertendo a lógica esperada pelo mercado e trazendo resultados negativos aos investimentos nesse segmento. Os fundos de Renda Fixa das diversas estratégias tiveram rendimento de 2,28% no ano.
Com a previsão de um cenário de juros baixos, os analistas de renda variável calculavam preços justos elevados para os ativos, projetando o crescimento do Ibovespa para 2021 acima da média histórica. O que parecia um cenário promissor também sofreu impacto direto pelo aumento da curva de juros. Indiretamente, os juros mais altos tornam menos atrativos projetos idealizados pelas empresas de capital aberto, que contribuiriam também para seu crescimento. Logo, as empresas tendem a investir menor no seu próprio crescimento e também tornam as projeções menores.
Por fim, o cenário institucional turbulento e o risco fiscal fazem com que os investidores estrangeiros optem por não correr o risco de manter o dinheiro no nosso país e retirem esse capital daqui, em especial nos ativos de Bolsa, onde representam quase 1/3 das negociações. Essa venda maciça de ativos derrubou os preços a partir de junho, atingindo 20% de queda agora em outubro, impactando todas as alocações em renda variável, inclusive nos ativos do segmento imobiliário, composto predominantemente por cotas de fundos de investimento imobiliário negociados em bolsa. Já o segmento de renda variável que vinha em alta até junho devolveu todos os ganhos e encolheu em 5,54% e o segmento imobiliário reduziu 3,31%.
Por fim, o investimento no exterior representou o folego da carteira, já que a saída de capital estrangeiro do Brasil, que elevou consideravelmente a cotação do dólar, influenciou positivamente os investimentos em fundos no exterior, que são afetados inclusive por essa variação. Para realizar o investimento no exterior, é necessário fazer a conversão cambial, logo, os gestores estavam comprados em dólar. Além disso, a recuperação econômica mais rápida por lá contribuiu para o resultado positivo dos ativos, independente da variação cambial, acumulando 19,36% de alta até setembro.
Para 2022, parece que teremos algum indício de calmaria e retorno aos padrões tradicionais de investimento. Embora a inflação seja mais elevada, teremos juros consideravelmente mais altos e necessidade de se expor a ativos de risco menor para cumprir nossas das metas. O Risco Brasil deve continuar alto, portanto, investimentos no exterior e investimentos em juros e moedas estrangeiras parecem interessantes para diversificação e diluição de risco.